O invento está disponível para licenciamento de potenciais empresas e instituições interessadas em explorar, bem como realizar testes pré-clínicos da tecnologia para viabilizar a utilização pela sociedade.
Texto: Caroline Roxo | Imagem: Arquivo pessoal de Nicolás A. Rey
Doenças como Parkinson e Alzheimer, classificadas como neurodegenerativas e crônicas, impactam significativamente o sistema motor e cognitivo do indivíduo, respectivamente. Estas condições, atualmente incuráveis, representam uma preocupação crescente para a saúde pública no Brasil. Esse alerta é amplificado pelo rápido envelhecimento populacional observado no país. Segundo o Censo Demográfico de 2022, o percentual de brasileiros com 65 anos ou mais alcançou 10,9%, um aumento de 57,4% em comparação com 2010, quando apenas 7,4% da população estava nessa faixa etária.
O pesquisador Nicolás A. Rey, professor associado do Departamento de Química da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), dedica-se há mais de uma década ao estudo de doenças neurodegenerativas, como Parkinson e Alzheimer. As pesquisas lideradas pelo professor Nicolás já envolveram vários outros pesquisadores e culminaram em descobertas classificadas com potencial de inovação, que foram protegidas em territórios como Brasil, Estados Unidos e União Europeia. Uma dessas invenções foi a patente registrada junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), com o suporte da Agência PUC-Rio de Inovação (AGI/PUC-Rio), sobre compostos com potencial terapêutico relacionados a doenças degenerativas.
Nicolás esclarece que as doenças degenerativas são patologias multifatoriais, ou seja, são afetadas por uma variedade de elementos que convergem para a degeneração cerebral através da morte de neurônios. No caso do Parkinson e Alzheimer, elas estão associadas à agregação patológica de proteínas específicas, incluindo a alfa-sinucleína, relacionada ao mal de Parkinson, e o peptídeo beta-amiloide, vinculado ao Alzheimer.
Segundo ele, “agregados solúveis e insolúveis de distintas proteínas atacam diferentes regiões do cérebro, afetando as áreas motora e cognitiva dos pacientes e resultando assim nos sintomas de cada doença”. Neste contexto, foi identificado um composto destinado à inibição de um dos mecanismos de progressão dessas doenças, especificamente aquele que envolve a interação entre essas proteínas e metais fisiológicos (naturalmente presentes em nosso organismo).
Uma das causas para o desenvolvimento de doenças degenerativas
Para compreender a tecnologia proposta pelos pesquisadores da PUC-Rio é importante entender como funciona um dos mecanismos de progressão das doenças. Conforme explica o professor Nicolás A. Rey, “algumas proteínas associadas a doenças degenerativas, como Parkinson e Alzheimer, interagem com metais como cobre e ferro no cérebro. Esta interação resulta na agregação proteica e produção de radicais livres, em sua maioria espécies reativas de oxigênio causadoras de danos significativos. Os radicais livres são responsáveis pela destruição de sinapses, que são as conexões vitais entre os neurônios. Com a deterioração extensa dessas conexões, começam a surgir os sintomas característicos de cada doença, marcando uma progressão notável no quadro clínico dos pacientes”.
O composto, fruto das pesquisas realizadas por Nicolás A. Rey e por Daphne S. Cukierman, reconhecida em 2021 como a doutora mais jovem do Brasil em todas as áreas do conhecimento, pode ajudar a bloquear a ligação das proteínas causadoras de doenças como Parkinson e Alzheimer aos metais presentes no cérebro, impedindo assim o avanço desse mecanismo patológico específico da doença.
“Levam anos para uma pessoa apresentar os sintomas das doenças degenerativas. Pessoas saudáveis perdem naturalmente neurônios ao longo da vida. No entanto, um paciente com doença degenerativa apresenta perdas significativas, que são resultantes de um processo lento e demorado. E, quando aparecem os primeiros sintomas, a perda de neurônios já está muito avançada”, explica Nicolás.
Conheça a tecnologia: Compostos com potencial para tratar doenças degenerativas
A tecnologia desenvolvida por pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e protegida com o apoio da Agência PUC-Rio de Inovação (AGI/PUC-Rio) funciona como uma troca de ligações. O composto, da classe das N-acil-hidrazonas, opera na prevenção da progressão de doenças neurodegenerativas ao competir com proteínas patogênicas pela ligação aos metais no cérebro. No decorrer desse processo, o composto demonstrou superioridade ao prevalecer na competição, efetivamente se ligando aos metais e, consequentemente, obstruindo essa via de avanço da doença.
“É preciso que o composto tenha uma afinidade suficiente para tirar a proteína do metal, mas ao mesmo tempo sem mexer com os metais que estão nos locais corretos. Tem que trabalhar muito a afinidade. Precisa ter uma ligação moderada com o metal. De forma a não atrapalhar o fluxo metabólico do indivíduo”, expõe Rey.
O pesquisador Nicolás A. Rey passou mais de uma década pesquisando sobre doenças degenerativas | Imagem: Arquivo pessoal de Nicolás A. Rey
Há mais de uma década, as investigações conduzidas pelo pesquisador têm se dedicado ao aprimoramento de uma série de compostos químicos com potencial terapêutico para doenças neurodegenerativas. Os estudos focam em otimizar a eficácia de ligação do composto a metais, aumentar sua solubilidade, assegurar sua passagem pela barreira hematoencefálica e confirmar sua não toxicidade. Esses avanços já resultaram na obtenção de três patentes, registradas ou concedidas em jurisdições estratégicas como Brasil, Estados Unidos e Europa.
A pesquisa que culminou na mais recente patente foi desenvolvida entre os anos de 2017 e 2021 e focou no desenvolvimento de novas N-acil-hidrazonas contendo o grupo 1-metilimidazol, observando-se uma melhoria significativa na solubilidade e estabilidade das moléculas. Essa tecnologia passou por testes in vitro e também foi avaliada em experimentos com camundongos, nos quais o peptídeo associado ao Alzheimer em humanos foi injetado no cérebro dos roedores. Os resultados demonstraram que a administração prévia do composto nos camundongos impediu o aparecimento dos sintomas da doença.
Expectativas para o futuro
Para a tecnologia ser transformada em um potencial medicamento para tratamento prévio dessas doenças, é necessário que o invento seja licenciado para uma empresa ou instituição interessada em explorar o material, a fim de realizar testes pré-clínicos adicionais, clínicos e posteriormente identificar a melhor forma de comercialização e distribuição para a sociedade. O licenciamento das tecnologias é feito por intermediação da Agência PUC-Rio de Inovação.
“O composto poderia ter um forte potencial para tratamento preventivo. Por exemplo, há casos de Alzheimer com uma forte componente hereditária. Nesta situação, se o paciente realizar um exame genético e identificar positivo pro gene APOE e4, seria interessante um possível tratamento prévio”, propõe Nicolás.
Enquanto a pesquisa está no âmbito acadêmico, Nicolás afirma que segue com as investigações em torno dessa família de compostos, realizando testes de ligações com outras moléculas e verificando a atuação de outras funções. O pesquisador também comemora o alcance de um patrocínio da empresa Stone, por meio do StoneLab, voltado estritamente para a continuidade das pesquisas.
- Conheça as formas de conexão e licenciamento de tecnologia: https://www.agi.puc-rio.br/empresas
- Veja outras tecnologias disponíveis para licenciamento na Vitrine Tecnológica da PUC-Rio: https://www.agi.puc-rio.br/vitrine-tecnologica/