Entre as aplicabilidades, a invenção possibilita alternativa sustentável para troca de calor microfluídica, análise eletroquímica e condução elétrica
Texto: Nayara Campos | Imagens: divulgação CNPEM
Pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) desenvolveram uma tecnologia inovadora que permite o uso do bambu, um material naturalmente isolante, como condutor elétrico e aquecedor microfluídico. A inovação representa um avanço significativo por utilizar recurso natural e renovável como alternativa aos materiais convencionais, tornando o processo menos oneroso e mais sustentável.
Os estudos liderados por Omar Ginoble Pandoli, pesquisador da PUC-Rio e da Universidade de Génova, Murilo Santhiago, pesquisador do CNPEM na área de nanotecnologia, e Mathias Strauss, à época pesquisador do CNPEM, demonstram que o bambu pode ser tratado e modificado para conduzir calor e eletricidade de maneira eficiente, oferecendo uma solução inovadora que combina eficiência térmica e elétrica ao impacto ambiental reduzido, ao substituir o uso de metais e plásticos para esta finalidade.
O bambu condutor desenvolvido atrai atenção significativa para as possibilidades de utilização na arquitetura e eletrônica ao ser um potencial substituto para fios elétricos e canos. Com sua resistência e propriedades condutoras, a planta pode substituir materiais tradicionais em diversas aplicações, contribuindo para a redução da pegada ambiental da indústria e promovendo o respeito do meio ambiente, se consideradas as vantagens de uso sustentável da planta de bambu.
Como funciona a invenção
Por meio do revestimento interno dos microcanais do bambu com tinta metálica à base de prata, a partir da técnica de sucção a vácuo, os pesquisadores obtiveram canais condutores ocos para passagem de gases, fluidos e eletricidade.
Radiografia exibe um bambu em seu estado natural (à esquerda)
e outro com microcanais pintados (à direita) | Divulgação CNPEM
Segundo Pandoli, “o bambu é naturalmente uma planta isolante e tornamos ela um condutor, introduzindo nos interiores dos canais uma pasta condutora. A partir disso, o bambu tornou-se um dispositivo elétrico e eletroquímico”, explica o pesquisador. “Elétrico porque com a pasta condutora se aplica uma diferença de potencial, passando a corrente, e podem ser criados circuitos elétricos para ligar led luminoso. Também, por efeito joule, é capaz de esquentar líquidos como a água, que usamos nos testes, neste caso, obtido um trocador de calor microfluídico. E Eletroquímico porque conseguimos isolar três porções do bambu em três diferentes eletrodos e isso na eletroquímica pode ser usado como um sensor para medir uma substância química, tornando-se um sensor eletroquímico”.
Para Santhiago, um dos diferenciais da invenção é utilizar a própria estrutura natural do bambu, sem necessidade de adaptações. “Nós aproveitamos a estrutura que a natureza criou, que são os microcanais, e é como se tivéssemos passando uma fiação dentro do bambu, mas por um processo inovador que dispensa os fios e usa somente uma tinta metálica”, explica.
O pesquisador pontua também que o fato do bambu ser uma planta de crescimento acelerado facilita ainda mais o processo, visto que a natureza tem um potencial de criação da planta e seus microcanais de forma mais ágil do que se fosse necessário produzi-los a partir de técnicas de microfabricação, como uma impressão 3D, por exemplo.
O potencial do bambu para esta aplicação
O bambu é uma planta abundante no Brasil e, segundo dados da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), o estado do Acre abriga a maior floresta de bambu do mundo, ocupando sete milhões de hectares. Somado a isso, o rápido crescimento da planta, que tem cerca de 200 espécies diferentes no país, possibilita a escalabilidade do uso do bambu para fins industriais e comerciais sem comprometer esta vegetação.
De acordo com Pandoli, “o problema prioritário, hoje, é pensarmos em quais recursos naturais podemos usar. A ideia de utilizar massas vegetais é favorável porque são fontes renováveis, biodegradáveis e biocompatíveis, e o bambu entre elas é a planta que cresce mais rapidamente, com algumas espécies crescendo até um metro por dia”, afirma. “Então a escalabilidade de dispositivos construídos a partir do bambu é sustentável, pois a biomassa se renova muito rapidamente, diferente de outras árvores”.
Outro ponto positivo destacado pelo pesquisador é que o bambu é uma planta rizoma — uma raiz que nasce embaixo da terra e vai brotando para a superfície — que quanto mais é podada, mais forte fica, ao contrário de outras plantas que conforme são cortadas tendem a morrer, sendo necessário uma espera de anos até que cresça novamente.
Próximos passos
Com eficácia comprovada em testes laboratoriais, os pesquisadores ressaltam que a invenção encontra-se disponível para parcerias do setor industrial para checar as possibilidades de produção dos dispositivos em grande escala. Além disso, Pandoli destaca o potencial da tecnologia para uso pedagógico. “A invenção poderia facilmente ser utilizada para divulgação científica nas escolas, explicando como funciona um trocador de calor ou um processo eletroquímico, porque eletrodos convencionais são caríssimos, chegando a cerca de R$ 5 mil”, endossa.
A pesquisa contou com o financiamento da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ). Com auxílio da Agência PUC-Rio de Inovação (AGI/PUC-Rio), a invenção tem patente junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) e faz parte do portfólio de patentes da PUC-Rio disponíveis para o licenciamento pelo setor industrial.
- Conheça as formas de conexão e licenciamento de tecnologia: https://www.agi.puc-rio.br/empresas
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