Invenção possibilita rota de síntese mais econômica de molécula com potencial farmacológico e empresas são chave para iniciar os testes in vivo
Texto: Nayara Campos | Imagem: acervo pessoal Camilla Buarque
A fibrose cística é considerada uma doença genética rara, que pode ser diagnosticada no teste do pezinho e, segundo dados do Ministério da Saúde, atinge cerca de um a cada 10 mil nascidos vivos no Brasil. Caracterizada por uma mutação celular na proteína CFTR, que controla o movimento dos íons de cloreto e sódio nas membranas das células, a condição faz com que o indivíduo tenha uma produção excessiva de secreções e muco mais espesso, afetando principalmente os pulmões. A patologia aumenta a suscetibilidade a infecções pulmonares, podendo também acometer o aparelho digestivo, intestino, pâncreas, fígado, os rins e seios da face.
Sem cura, o tratamento da fibrose cística é fundamental para aumentar a expectativa e melhorar a qualidade de vida de pacientes com a doença. O fato de ter o filho diagnosticado com a enfermidade foi o que motivou a pesquisadora Drª. Camilla Buarque, coordenadora do LabSint (Laboratório de Síntese Orgânica) e professora associada do Departamento de Química da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), a dedicar-se à pesquisa desde 2016, com o objetivo de encontrar soluções alternativas para o tratamento da doença.
O resultado da pesquisa — uma molécula promissora para o tratamento de fibrose cística — levou a pesquisadora a buscar a Agência PUC-Rio de Inovação (AGI/PUC-Rio) para depositar um pedido de patente junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). A tecnologia agora faz parte do portfólio de patentes da PUC-Rio disponíveis para o licenciamento pelo setor industrial.
“Sabemos que o setor farmacêutico é um dos setores mais pré-dispostos a estabelecer parcerias e licenciamento de tecnologias. No caso desta molécula, já temos o pedido de patente encaminhado e estamos em busca de um parceiro para licenciar e seguir com o desenvolvimento complementar”, afirma Priscilla Ricci, Gerente Executiva da AGI/PUC-Rio. A AGI é o órgão da universidade responsável pela proteção da propriedade intelectual, bem como pela transferência de tecnologias de propriedade da universidade.
Uma única molécula com potencial farmacológico e rota sintética mais barata
Segundo Buarque, o tratamento da fibrose cística envolve medicamentos de alto custo, de forma que, para garantir acesso aos cuidados necessários, é benéfico o desenvolvimento de um novo fármaco com síntese menos onerosa. “O medicamento trikafta, recentemente incorporado no SUS, depois de muita luta das Associações de Fibrose Cística, tem o preço altíssimo”, destaca. De acordo com a pesquisadora, o fármaco tem uma combinação de 3 princípios ativos com estruturas complexas, o que leva a uma síntese em várias etapas e mais cara. “Essa molécula que desenvolvemos possui uma rota sintética bem simples, o que pode tornar o processo menos oneroso, sendo este o grande diferencial”, afirma.
A invenção encontra-se na fase de testes in vitro e conta com a participação do biomédico e pesquisador Dr. Miquéias Lopes Pacheco, pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, atuando com a avaliação biológica dos compostos para a comprovação da tese de que a molécula era capaz de corrigir a função do gene CFTR. “Já nos testes in vitro, podemos perceber que o composto age como corretor deste gene CFTR, o que significa que a molécula é capaz de fazer com que o gene traduza uma proteína correta, que chegue até a membrana”, explica Buarque.
Próximos passos
Para avançar para a fase de testes in vivo, a pesquisadora afirma ser necessária a captação de investimento, incluindo financiamento por parte da iniciativa privada. “É um longo caminho entre uma molécula e um fármaco. Mas para os próximos passos, precisamos dos estudos in vivo, e este é o grande gargalo que temos no momento, pois precisamos de financiamento para poder continuar os testes”.
De acordo com Buarque, se comparado com o fármaco comercial, o composto desenvolvido tem uma potência um pouco menor. Por outro lado, a invenção conta com apenas uma molécula, enquanto o fármaco comercial utiliza três. A pesquisadora afirma que estão investindo em modificações para melhorar ainda mais a potência da molécula.
Além da Drª. Camilla Buarque e do Dr. Miquéias Lopes Pacheco, alunos de pós-graduação da PUC-Rio e da UFRJ também participam da pesquisa, dedicando-se à síntese dos compostos e aos testes in vitro, processo feito nos laboratórios e na central analítica das universidades envolvidas.
A pesquisa contou com o financiamento das instituições Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e Cystic Fibrosis Foundation (CFF).
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